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segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Notícias de jornal em um universo de desordem

Drica Moraes enfrenta a burocracia para encenar ‘A ordem do mundo’

As pilhas de jornais que cercam a atriz Drica Moraes aí ao lado fazem parte do cenário de A ordem do mundo, monólogo que estréia no dia 1º, no Teatro Clara Nunes. Mas podem servir de metáfora à papelada com que a atriz teve de lidar até pôr o espetáculo de pé: os textos que leu até chegar à peça de Patrícia Melo; o cipoal burocrático enfrentado para ganhar sinal verde pela Lei Rouanet; e o dinheiro que tirou da poupança para bancar a produção. Quantia que preferiu não revelar.

– Dei entrada para me habilitar pela Lei Rouanet em junho. Mas só em março consegui a aprovação para correr atrás de patrocínio. Então, tirei dinheiro da poupança e botei na peça. Mas estou muito feliz de estar sendo a Robin Hood do teatro – conta Drica, que pela primeira vez tirou dinheiro do bolso para bancar um espetáculo.

Feliz como uma dondoca na Daslu com cartão de crédito ilimitado. Mas o shopping de Drica é outro. E o cartão poderia estourar. Por isso, a atriz procurou um espetáculo que não tivesse ares de superprodução e com poucos atores. Nas suas palavras, uma peça portátil. Quando pôs os olhos em A ordem do mundo, decidiu-se pelo texto. Em Londres, onde passou uma temporada de um ano e oito meses, comprou o pré-direito da obra. De lá também fez contato com o diretor Aderbal Freire-Filho, antigo sonho de consumo, que não só topou como contou a Drica que já conhecia a peça.

– Escolhi fazer à moda antiga: com um superdiretor e com cenário. Hoje em dia as peças não têm cenário. Botam um pano preto porque não há dinheiro. Disse para Aderbal que era algo carmático; para ele fazer – lembra.

A história que encantou Drica é sobre uma mulher, culta e inteligente, cujo trabalho é ler todos os jornais, analisar e classificar as notícias, numa tentativa de entender e ordenar o mundo. Nenhum assunto escapa ao seu humor corrosivo e sarcástico: política, economia, obituários, atentados internacionais. O mesmo humor que usa para avaliar as situações que vive no dia-a-dia, questões familiares e relacionamentos amorosos. Uma certa indefinição de estilo também atraiu a atriz,

– É uma peça que não dá para definir como comédia, nem como drama ou como tragédia. Mas em poucos segundos a gente percebe que a personagem está falando de algo muito reconhecível. Ela tenta botar ordem no mundo ao mesmo tempo em que sua vida vai entrando em profunda desordem – explica.

Aderbal ajudou na identificação e na construção dessa personagem multifacetada. Drica conta que o diretor distinguiu cinco diferentes maneiras de interpretação: "Um pouco de humor de costumes, um pouco de comédia de costumes, um pouco de cientista (um texto um pouco mais árido, mais jornalístico), um tônus interpretativo mais ligado a essa linha de modelos e manequins que há hoje (que é uma tendência). Há também ela em ação mesmo, operária, e ela mãe, mulher". Durante os ajustes finos que eram feitos nos ensaios, diretor e atriz calibravam o ritmo da personagem.

– Fazia o espetáculo numa hora e meia. Disse ao Aderbal que não dava para ter um monólogo com essa duração. As pessoas iam jogar tomate em mim. Ele me respondeu: "Se vira". O ritmo é a personagem. Se você fizer ela mais rápida, vai descobrir o espírito dela. Agora faço em uma hora e cinco minutos – comemora.

Fonte: Jornal do Brasil - 27/04/08

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